O dom do entendimento, também chamado “dom da inteligência” ou “dom do discernimento” (diferente do discernimento dos espíritos), nos dá uma compreensão profunda das verdades reveladas, sem contudo nos revelar o seu mistério. Só teremos plena compreensão do mistério quando estivermos face a face com Deus.
Quanto ao Dom da Inteligência, ele é a relação mais íntima que Deus estabelece com a alma (sabemos que a alma é racional, logo, exerce inteligência). Dessa forma, uma vez humilhados (pelo Dom do Temor), buscando as nobres afeições (Dom da Piedade), sendo-nos revelada a verdade (Dom da Ciência), a alma adere com profundeza e intimidade com Aquele que é seu Criador (Dom da Inteligência). Ele é o primeiro favor do Espírito Santo ao fiel que se humilha, aspira afeições e adere à verdade. Tal Dom consiste na iluminação da alma esclarecida (inteligente) desde então por uma luz superior (inteligência suprema). Dom da Inteligência significa iluminação, Fé e Razão!

Pe. Senra Coelho
Revista “Família Cristã”
Edição de Portugal Fevereiro/2008
A Sagrada Escritura mostra-nos constantemente a solicitude com que Deus nos guia pelos Seus caminhos. Ele apresenta-se como a verdadeira Luz de Israel, sem a qual o povo se perde na escuridão. Por sua vez o Povo de Israel pede a Yahvé para que o conduza pelos Seus caminhos; “Dá-me a conhecer os Teus caminhos” (Ex 33, 13), é a oração de Moisés para guiar o povo até à Terra prometida, pois sem a Sua presença sente-se perdido; o rei David suplicava: “Dá-me entendimento para que guarde a Tua lei e a cumpra de todo coração” (Sl 119,34).
Nos Evangelhos, Jesus promete o Espírito da Verdade, o qual terá por missão iluminar toda a Igreja, “Quando Ele vier, o espírito da Verdade, há de guiar-vos para a Verdade completa. Ele não falará por si próprio mas há de dar-vos a conhecer quanto ouvir e anunciar-vos o que há de vir”. (Jo 16,13). O Concílio Vaticano II reafirma esta certeza: “Com o envio do Espírito da Verdade, Deus completa perfeitamente a revelação e confirma com o seu testemunho divino que verdadeiramente está conosco para nos libertar das trevas do pecado e da morte e nos ressuscitar para a vida eterna”. (Dei Verbum Nº4). De fato, só posteriormente, os Apóstolos compreenderam o sentido das Palavras do Senhor, que antes do Pentecostes lhes pareciam obscuras.
O Papa Paulo VI, ao referir-se ao Espírito Santo ensinou na Exortação Apostólica Evangelii Nuntiandi que “Ele é a alma da Igreja. É Ele quem explica aos fiéis o sentido profundo dos ensinamentos de Jesus e dos seus mistérios” (8.XII/1975, nº75). Referindo-se ao Dom do Entendimento e relacionando-o com o Dom da Fé, o Concílio Vaticano II aprofunda a Sua presença em nós: “Para professar esta Fé, é necessária a graça de Deus que previne e ajuda, e os auxílios internos do Espírito Santo, o qual renova e converte para Deus os corações, abre os olhos da alma, e dê” a todos a suavidade no aderir e dar crédito à verdade”.” (Dei Verbum , nº5). Percebemos assim que mediante o Dom do Entendimento é dado ao fiel cristão um conhecimento mais profundo dos mistérios revelados, pois o Espírito Santo ilumina a inteligência com a Sua Luz e dá a conhecer com uma claridade nova o sentido profundo dos mistérios da Fé.

Vamos percorrer alguns ensinamentos dos Santos Padres para percebermos melhor a riqueza do Dom do Entendimento. São Basílio ensina que “Do Espírito Santo provém o conhecimento das coisas futuras, a inteligência dos mistérios, a compreensão das verdades ocultas, a distribuição dos Dons, a cidadania celeste, a conversação com os anjos. D’Ele provem a alegria que nunca termina, a perseverança em Deus e, o mais sublime que pode ser pensado, o fazer-se Deus. (…) Fonte de santificação, luz da nossa inteligência, Ele é quem dá, de si mesmo, uma espécie de claridade à nossa razão natural, para que conheça a verdade. “Inacessível por sua natureza faz-se acessível por sua bondade, Tudo preenche com o seu poder, porém só se comunica aos que são dignos d’Ele, e não a todos na mesma medida, mas distribui os seus dons em proporção à fé de cada um” (Sobre o Espírito Santo, 9, 22-23).
São Cirilo de Jerusalém afirma que “(…) do mesmo modo que aquilo que se encontrava nas trevas, ao surgir o sol, recebe a sua luz através dos olhos do corpo e assim pode contemplar com toda a claridade o que antes não via, assim também aquele que é considerado digno do Dom do Espírito Santo é-lhe iluminada a alma e levantando-se acima da sua razão natural vê o que anteriormente ignorava.” (Catequesis, 16, sobre o Espírito Santo, 1). Concluímos com São Gregório Magno, que exclama: “Oh, que artífice é este Espírito! “Rapidamente se aprende tudo aquilo que Ele quer; Imediatamente que toca a nossa mente, ensina, e só o ter tocado é ter já ensinado: ao mesmo tempo em que ilustra a alma, a transforma; oculta repentinamente o que era e manifesta o que não era.” (Homilia 30 sobre os Evangelhos). É graças ao Dom do Entendimento que “Deus é antevisto aqui em baixo”, afirma São Tomás de Aquino sobre os que são dóceis às moções do Espírito Santo, ainda que os mistérios da Fé continuem sempre envolvidos por certa nebulosidade, devido à sua infinita grandeza (1-2, q.62, a.2.).
Para chegar ao conhecimento íntimo de Deus não basta ter Fé, é necessário uma efusão específica do Espírito Santo, cuja recepção depende da nossa abertura de coração e correspondência à Graça, da nossa purificação interior e da verdade da nossa fome de Deus. O Dom do Entendimento permite que a alma participe do olhar de Deus, que penetra todas as coisas até ao âmago do seu ser, ajuda-nos a contemplar e a amar a grandeza de Deus entregando à Sua Paternidade o nosso afeto filial e a ver n’Ele adequadamente as coisas criadas, “Como alguém que sem ter aprendido nem trabalhado nada para saber ler e nem sequer tivesse estudado nada, achasse que já sabia toda a ciência, sem saber como, nem donde lhe tinha vindo, pois nunca tinha trabalhado, nem sequer para aprender o alfabeto. Esta última compreensão ensina algo sobre este dom celestial, porque a alma vê num momento o mistério da Santíssima Trindade e outras coisas muito elevadas com tal claridade, que não há teólogo com quem não se atravesse a discutir estas verdades tão grandes.” Assim partilha Sta. Teresa de Ávila o Dom do Entendimento (Vida, 27,8-9).
A nós cabe-nos merecer este Dom através da verdade das nossas vidas, da nossa oração; entendendo, sobretudo que a vida cristã se constrói através da nossa correspondência aos dons de Deus, pois “cada um dos Santos é uma obra-prima do Espírito Santo” (Beato João XXIII, Aloc. 5 – VI. 1960) e esse será também o nosso caminho, a abertura íntima ao Dom de Deus.
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Quarta-feira, 30 de abril de 2014
Queridos irmãos e irmãs,
Depois de ter falado da sabedoria, como primeiro dos sete dons do Espírito Santo, hoje gostaria de colocar a atenção sobre o segundo dom, isso é, oentendimento. Não se trata daquela inteligência humana, da capacidade intelectual de que podemos ser mais ou menos dotados. É, em vez disso, uma graça que só o Espírito Santo pode infundir e que suscita no cristão a capacidade de ir além do aspecto externo da realidade e perscrutar as profundezas do pensamento de Deus e do seu plano de salvação.
O apóstolo Paulo, dirigindo-se à comunidade de Corinto, descreve bem os efeitos deste dom – isso é, o que faz o dom do entendimento em nós – e Paulo diz isso: “Coisas que os olhos não viram, nem os ouvidos ouviram, nem o coração humano imaginou (Is 64, 4) tais são os bens que Deus tem preparado para aqueles que o amam. Todavia, Deus no-las revelou pelo seu Espírito” (1 Cor 2,9-10). Isso obviamente não significa que um cristão possa compreender cada coisa e ter uma plena consciência dos planos de Deus: tudo isso permanece à espera de manifestar-se em toda a sua clareza quando nos encontrarmos diante dos olhos de Deus e formos realmente uma só coisa com Ele. Porém, como sugere a própria palavra, a inteligência permite “intus legere”, isso é, de “ler por dentro”: este dom nos faz entender as coisas como Deus as entende, com a inteligência de Deus. Porque uma pessoa pode entender uma situação com a inteligência humana, com prudência, e tudo bem. Mas entender uma situação em profundidade, como a entende Deus, é o efeito deste dom. E Jesus quis enviar-nos o Espírito Santo para que nós tenhamos este dom, para que todos nós possamos entender as coisas como Deus as entende, com a inteligência de Deus. É um belo presente que o Senhor deu a todos nós. É o dom com o qual o Espírito Santo nos introduz na intimidade com Deus e nos torna participantes do plano de amor que Ele tem conosco.
É claro, então, que o dom da inteligência está estreitamente conectado à fé. Quando o Espírito Santo habita o nosso coração e ilumina a nossa mente, faz-nos crescer dia após dia na compreensão daquilo que o Senhor disse e realizou. O próprio Jesus disse aos seus discípulos: eu vos enviarei o Espírito Santo e Ele vos fará entender tudo aquilo que eu vos ensinei. Entender os ensinamentos de Jesus, entender a sua Palavra, entender o Evangelho, entender a Palavra de Deus. Alguém pode ler o Evangelho e entender alguma coisa, mas se nós lemos o Evangelho com este dom do Espírito Santo podemos entender a profundidade das palavras de Deus. E isto é um grande dom, um grande dom que todos nós devemos pedir e pedir juntos: Dai-nos, Senhor, o dom do entendimento.
Há um episódio do Evangelho de Lucas que exprime muito bem a profundidade e a força deste dom. Depois de ter visto a morte na cruz e o sepultamento de Jesus, dois de seus discípulos, desiludidos e tristes, vão a Jerusalém e retornam ao vilarejo de nome Emaús. Enquanto estão a caminho, Jesus ressuscitado se aproxima e começa a falar com eles, mas os seus olhos, velados pela tristeza e pelo desespero, não são capazes de reconhecê-Lo. Jesus caminha com eles, mas eles estão tão tristes, tão desesperados, que não O reconhecem. Quando, porém, o Senhor explica a eles as Escrituras, para que compreendessem que Ele deveria sofrer e morrer e depois ressuscitar, as suas mentes se abrem e nos seus corações se reacende a esperança (cfr Lc 24, 13-27). E isto é o que faz o Espírito Santo conosco: abre-nos a mente, abre-nos para entender melhor, para entender melhor as coisas de Deus, as coisas humanas, as situações, todas as coisas. É importante o dom do entendimento para a nossa vida cristã. Peçamos esse dom ao Senhor, que nos dê, que dê a todos nós este dom para entender, como Ele entende, as coisas que acontecem e para entender, sobretudo, a Palavra de Deus no Evangelho. Obrigado!
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